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Canídeos na luta contra a extinção

A concorrência por recursos entre diferentes linhagens de canídeos e outros grupos de carnívoros que habitaram a América do Norte ao longo dos últimos 40 milhões de anos causou a extinção de duas subfamílias da família Canidea, a que pertencem hoje os cães, raposas, lobos e coiotes, entre outros.

A conclusão é de um estudo realizado por pesquisadores da University of Gothenburg, do Swiss Institute of Bioinformatics e do Gothenburg Botanical Garden, da Suécia, em colaboração com Tiago Bosisio Quental, professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP).

Resultado do projeto “O papel das taxas de extinção e especiação e o efeito dos diferentes níveis de organização biológica na origem e manutenção da biodiversidade”, realizado por Quental com apoio da Fapesp, na modalidade Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes, o estudo foi publicado na revista PNAS, da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.

“Analisamos o registro fóssil de diferentes linhagens de Carnivora e os nossos resultados sugerem que a interação entre diferentes linhagens de canídeos e delas com outros grupos de carnívoros parece ter desempenhado um papel muito importante na extinção de duas subfamílias de canídeos”, disse Quental à Agência Fapesp.

De acordo com o pesquisador, os canídeos surgiram há 40 milhões de anos na América do Norte e dividiram-se em três subfamílias principais – a Hesperocyoninae, a Borophaginae (chamados de “cães de esmagamento de ossos”) e a Caninae –, que conviveram por um longo período.

Duas dessas três subfamílias – a Hesperocyoninae e a Borophaginae – foram extintas em momentos diferentes ao longo desses 40 milhões de história evolutiva dos canídeos. A única subfamília sobrevivente foi a Caninae.

A fim de identificar o que levou as subfamílias Hesperocyoninae e a Borophaginae à extinção, os pesquisadores avaliaram cerca de 1,5 mil registros fósseis de 120 espécies de canídeos, que abrangem toda a existência da família na América do Norte ao longo dos últimos 40 milhões de anos.

Além disso, estudaram 744 registros fósseis de 115 espécies de famílias de grandes carnívoros que conviveram com os canídeos nesse período, como os felídeos – à qual pertencem hoje os tigres, leões, onças e gatos domésticos –, os Amphicyonidae (conhecidos como cães-urso), os Nimravidae (falsos dentes-de-sabre), os Barbourofelidae (outra linhagem de dentes-de-sabre) e os Ursidade (ursos).

Com base nesses registros fósseis, os pesquisadores estimaram o momento de surgimento e desaparecimento, a diversidade e as taxas de especiação e extinção das espécies de cada grupo ao longo dos últimos 40 milhões de anos.

A partir da análise desse conjunto de dados, eles avaliaram qual foi a contribuição da competição entre esses diferentes grupos de animais carnívoros, além da evolução do tamanho do corpo – que é um indicador de mudança de dieta – e as mudanças climáticas nas taxas de especiação e extinção das subfamílias Hesperocyoninae e Borophaginae.

Uma das conclusões do estudo foi que a concorrência por recursos desempenhou um papel mais importante na evolução dos canídeos do que as mudanças climáticas.

“Observamos que a concorrência entre linhagens diferentes de canídeos e com outros grupos de carnívoros contribuiu fortemente para o desaparecimento e a substituição das subfamílias Hesperocyoninae e Borophaginae, ao aumentar suas taxas de extinção e suprimir a especiação”, afirmou Quental.

Concorrência entre grupos

Os pesquisadores constataram, a partir da análise dos registros fósseis, que o tamanho do corpo dos canídeos da subfamília Borophaginae – que era menor do que os animais da subfamília Hesperocyoninae – aumentou progressivamente ao longo de sua história evolutiva.

Com isso, esses animais tornaram-se semelhantes aos canídeos da subfamília Hesperocyoninae entre 20 milhões e 10 milhões de anos atrás e, provavelmente, começaram a competir mais fortemente por recursos com eles.

Nesse período, a subfamília Hesperocyoninae registrou taxas de extinção significamente mais elevadas, apontaram os autores do estudo.

“Pressupomos que, muito provavelmente, ocorreu uma competição por recursos entre essas duas linhagens de canídeos, que causou o aumento da taxa de extinção da subfamília Hesperocyoninae”, disse Quental.

A chegada dos felídeos à América do Norte há, aproximadamente, 20 milhões de anos, vindos da Eurásia, intensificou a concorrência entre as diferentes linhagens de carnívoros existentes na região na época e contribuiu para a extinção completa da subfamília Hesperocyoninae.

Mas, mais do que isso: essa imigração dos felídeos parece ter tido um papel importante no desaparecimento da subfamília Borophaginae, indica o estudo.

Composta por, aproximadamente, entre 30 e 40 espécies de animais, a subfamília Borophaginae começou a entrar em declínio de diversidade a partir da entrada dos felídeos na América do Norte e se extinguiu há cerca de 4 milhões de anos.

“Nossos dados sugerem que as taxas de extinção das subfamílias Borophaginae e Hesperocyoninae estão relacionadas com a expansão da diversidade dos felídeos na América do Norte”, disse Quental.

Uma das hipóteses dos pesquisadores para explicar o impacto mortal da chegada dos felídeos à América do Norte sobre a diversidade de canídeos é que esses animais podem ter se tornado predadores mais eficientes do que a maioria das espécies extintas de canídeos.

“A linhagem Caninae, que foi a única sobrevivente, aparentemente não foi afetada pelos felídeos”, disse Quental.

A suposição dos pesquisadores é que a subfamília Caninae sobreviveu porque a ecologia dos animais dessa linhagem pode não ser similar à dos felídeos e das subfamílias que se extinguiram.

“Isso não quer dizer que não ocorram extinções na linhagem Caninae. As extinções nessa subfamília ocorreram sistematicamente ao longo do tempo, mas as espécies que desapareceram foram substituídas por outras”, ponderou Quental.

Fonte: Agência Fapesp

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